domingo, 27 de fevereiro de 2011

PEDAGOGIA DEMAIS, GESTÃO DE MENOS


João Tiago*


        Ser corporativista ou não ser, eis a questão.
      No relatório da UNESCO de 2009 foi apontado que o Brasil vai muito bem no que se refere ao índice de matrículas e muito mal em quesitos como evasão escolar e analfabetismo. A repetência é a maior da América Latina e a disparidade de gêneros - quanto à evasão –é gritante (18% e 25% entre meninos e meninas, respectivamente). Quando perguntados a respeito do objetivo da Educação, em pesquisa da própria UNESCO, os professores responderam, em 1º lugar com 72% que o objetivo primordial seria “formar cidadãos conscientes”. “Desenvolver a criatividade e o espírito crítico” ficou em segundo e “proporcionar conhecimentos básicos” ficou em terceiro. “Transmitir conhecimentos atualizados e relevantes” ficou em quarto.
      As entidades filiadas à CNTE estiveram reunidas em Brasília, nesta quinta-feira (24/02/2011), para debater o Plano Nacional de Educação. As questões levantadas durante o Seminário ajudaram a Confederação a elaborar tópicos que precisam ser debatidos antes da aprovação do PNE no Congresso Nacional. Os conteúdos dos levantamentos orbitaram a questão “investimento”. O que seria feito com esse aumento de investimento em relação ao PIB não foi um assunto amplamente e objetivamente discutido. Bom... Se a preponderância do quesito investimento fosse tão absoluta assim, os resultados de rendimento do Distrito Federal em relação a Minas Gerais não estariam tão similares visto que no planalto central investe-se quase três vezes mais por aluno que na terra de Tancredo Neves. Os quesitos “Políticas Públicas” e “estratégias conjuntas” não fizeram parte significativa da pauta.
      Os pedagogos que me perdoem, mas os cursos de Pedagogia não têm conseguido formar professores de qualidade e esta incompetência reverbera de forma alarmante nas séries finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio. Quem foi aluno de escola pública no DF cursando o primário em meados da década de 80 (há até um diretor do SINPRO que foi normalista e monitorava turmas no Gama) pode afirmar categoricamente que as Escolas Normais de Brasília davam de 10 a 0 em qualquer Curso de Pedagogia que funcione no Distrito Federal atualmente. Basta conversar com alguma colega pedagoga que antes do curso superior já fosse normalista, que você ficará sabendo que o que elas aprenderam de realmente aplicável foi desenvolvido durante o Curso Normal, principalmente durante as atividades práticas. Não venham com a velha conversa que a culpa é da Lei de Diretrizes e Bases porque o advento da LDB não é justificativa plausível para o baixo nível de qualidade dos Cursos de Pedagogia no Brasil.
      Se você conhece alguém que tenha cursado alguma Licenciatura na Universidade de Brasília faça-lhe as seguintes perguntas: Qual a faculdade ou Departamento da UnB que é mais bagunçado e inoperante? Qual ou quais as disciplinas do Curso de Licenciatura do Campus Darcy Ribeiro que requerem o menor esforço ou menos responsabilidade para se conseguir aprovação ao término do semestre? Se você obtiver como resposta “Faculdade de Educação”, “Instituto de Educação” ou outro termo parecido não será mera coincidência. Os Mestres e Doutores da Pedagogia da F.E. estão mais preocupados em comprovar teses particulares do que realmente mostrar resultados e consertar o que precisa ser consertado nos modelos de gestão. Quando tudo der errado, dirão que é “culpa do sistema”.
             O jargão educacional dos sábios da FE é interessante, pois toda tese pedagógica há de conter elementos “participativos”, “éticos”, “dialéticos”, “sociais”, “emocionais”, “democráticos” e outros tantos muito admiráveis e muitas vezes pouco práticos.  É até engraçado; todos os dias nos jornais lemos notícias que o Brasil desenvolve coisas de tal tipo: uma nova técnica para extrair petróleo em águas profundas, nova tecnologia para diminuir custo na extração de alumínio, nova técnica para clonar plantas através de pesquisa agropecuária, novo modo para cultivar algodão colorido etc. E uma nova técnica para fazer um aluno de quarta série saber ler e escrever adequadamente? Ah... essa técnica o Brasil (através dos seus cursos de Pedagogia) ainda não domina. Sendo assim, como ensinar Biologia, Filosofia, Sociologia e tantas outras disciplinas no Ensino Médio se o aluno não sabe o básico que é contar,ler e escrever? Qual a estratégia da Secretaria de Educação para melhorar significativamente o rendimento dos alunos nos 4 primeiros anos na escola e para tornar a carreira magistério mais atrativa e mais eficiente?
      Em dois meses de gestão, os responsáveis da Secretaria de Educação do Distrito Federal ainda não determinaram certas tarefas que já deveriam fazer parte da pauta do Governo mesmo antes de terem vencido as eleições. Os professores querem e merecem uma remuneração melhor e sem dúvida, um plano de isonomia paulatina e programada. Fora a carta de intenções do Agnelo, é improvável que apresentem uma planilha ou um projeto que demonstre a projeção de ajuste salarial antes do dia 1º de maio. Entretanto, esta não é a única questão importante para a melhoria na qualidade e nos índices educacionais do DF (que ao contrário do que alguns pensam, não são a mesma coisa). Pelo que tem sido noticiado nos próprios veículos de informação do Estado, não há perspectiva de intervenção no sentido de treinamento ou de preparo dos professores que começam a fazer parte da instrução pública. Os representantes da pasta educacional, assim como os responsáveis pelos cursos de Pedagogia, falam sempre em “dialogar”, “democratizar” e outros verbos caramelizados para tentar compartilhar com os professores a sua falta de posicionamento e o seu desconhecimento de procedimentos a serem tomados para melhorar os resultados.
      Na verdade, aquele período de transição do qual vários colegas participaram serviu apenas para que se discutisse distribuição de cargos. As questões de urgência educacional não foram debatidas, o que culminou em uma série de trapalhadas e adversidades que poderiam ser evitadas caso houvesse na cúpula da SEE “gente que faz” e não que apenas “gente que debate”. Qual o plano da SEE com relação ao Currículo?  Qual o plano da SEE com relação à coordenação das escolas com as vilas olímpicas? Qual o plano de integração da SEE com os conselhos tutelares para viabilizar uma melhor presença das famílias nas instituições de ensino? Qual o plano da SEE para minorar o absenteísmo nas escolas? Quais as estratégias para melhorar as coordenações pedagógicas? Qual o projeto ou o plano de critérios para definir a ocupação dos núcleos das Regionais e o tempo de permanência de professores fora de suas atribuições originais? Será que a Secretária tem conhecimento de coisas práticas como a diferença de modulação entre uma escola com 15 turmas e uma com 18? Será que é preciso contratar um matemático de renome para mostrar às esferas mandantes que é imprescindível que novas escolas sejam construídas, pois em termos de custos físicos e empregatícios a ação de agrupar 90 turmas em 6 escolas sai mais barato que agrupá-las em 5?
     A questão fundamental não diz respeito ao que querem os professores, mas sim ao que os mesmos merecem. Os professores merecem salários isonômicos com o teto salarial das carreiras de curso superior para que a carreira se torne atrativa e que diminua a migração dos profissionais mais talentosos que tendem a sair devido ao potencial desperdiçado por conta da remuneração pífia. Os professores merecem regras bem definidas de remoção e remanejamento que não mudem a cada ano e que possibilitem que organizem melhor a sua rotina. Em vez de muito discurso e muitos diários, registros mais simplificados e mais viáveis, dada a tecnologia que nos é disponibilizada na época em que nos encontramos. Os professores merecem uma burocracia especializada na sede da SEE e nas regionais e não apadrinhamentos políticos e politicagens que inflam o sistema público de ensino. Os professores merecem treinamento especializado antes de assumirem a sala de aula e redução de carga horária ou mudança nas atribuições à medida que se aproximam do topo da carreira. Quem melhor entende o sistema é quem nele está há mais tempo.
      Faltou quem dissesse isso ao Agnelo e aos demais gestores nas oportunidades em que muitos deles subiram no carro de som do SINPRO para fazerem uso da palavra para a multidão faminta por mudanças.

* João Tiago é professor da Secretaria de Educação do Distrito Federal

do blog    blogdowashingtondourado.wordpress.com 

Preciso comentar que me uno ao autor nas opiniões explicitadas no artigo. Convivo com professores que estudaram muito, possuem cursos que encheriam currículos de beleza, mas que se desdizem no dia a dia com alunos, colegas e sala de aula. Mas conheço também, professores que simplesmente SÃO, não importando seu currículo de estudos e pesquisas. Esses colegas que SÃO professores de modo completo, me inspiram e me esclarecem que SER professor é mais do que cursos superiores ou pós, ou mestrado... Conheço muitos professores que ESTÃO como contrato temporário que dão show de eficiência e de comprometimento, mesmo que muitos os vejam de modo inferior por estarem trabalhando apoiados apenas em seu curso técnico. Sou grata também a professores efetivos que em seu amor à educação me apoiaram e apoiarão ainda muitos outros para que o ensino seja pertinente na vida de muitos brasileirinhos.
Falta muito para que a educação não seja apenas mais uma obrigação governamental, mas que se torne no que acredito que ela seja: instrumento de libertação e de vida. 

Um comentário:

  1. Oi, Diane.
    Tudo bem?
    Eu sou o autor do artigo que você reproduziu.
    Que bom que assim como eu, você encare a educação sob a lente da responsabilidade e não sob a lente da utopia. Trabalho em uma escola que vc não acreditaria ser pública dado o estado em que ela se encontra e na qualidade do serviço prestado.
    Venha nos visitar qualquer dia desses e comprovar presencialmente que é possível uma educação diferente fundamentada na responsabilidade.
    Meu email é joaotiago78@hotmail.com e o meu blog é : http://joaotiagobasilisco.blogspot.com/2011_01_01_archive.html

    Abraço.
    JT

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